Wednesday, May 03, 2006

Interrogações Pop #3

There's no time for hatred, only questions
What is love, where is happiness, what is life, where is peace
When will i find the strength to bring me release?

"Eternal Life", Jeff Buckley
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A mão no arado

Feliz aquele que administra sabiamente
a tristeza e aprende a reparti-la pelos dias
Podem passar os meses e os anos nunca lhe faltará
Oh! como é triste envelhecer à porta
entretecer nas mãos um coração tardio
Oh como é triste arriscar em humanos regressos
o equilíbrio azul das extremas manhãs do verão
ao longo do mar transbordante de nós
no demorado adeus da nossa condição
É triste no jardim a solidão do sol
vê-lo desde o rumor e as casas da cidade
até uma vaga promessa de rio
e a pequenina vida que se concede às unhas
Mais triste é termos de nascer e morrer
e haver árvores ao fim da rua
É triste ir pela vida como quem
regressa e entrar humildemente por engano pela morte dentro
É triste no outono concluir
que era o verão a única estação
Passou o solitário vento e não o conhecemos
e não soubemos ir até ao fundo da verdura
como rios que sabem onde encontrar o mar
e com que pontes com que ruas com que gentes com que montes conviver
através de palavras de uma água para sempre dita
Mas o mais triste é recordar os gestos de amanhã
Triste é comprar castanhas depois da tourada
entre o fumo e o domingo na tarde de novembro
e ter como futuro o asfalto e muita gente
e atrás a vida sem nenhuma infância
revendo tudo isto algum tempo depois
A tarde morre pelos dias fora
É muito triste andar por entre Deus ausente
Mas, ó poeta, administra a tristeza sabiamente.

Ruy Belo
Considerações sobre o pecado, o sofrimento, a esperança e o verdadeiro caminho #3

Aos que se alimentam de sonho chega o momento em que não podem viver. A realidade não perde os seus direitos. Raia o dia em que se impõe por força e então o sonhador é colhido e triturado por ter esquecido. É o ponto trágico em que reconhece com espanto que não pode viver – que não sabe viver, e procura a morte, não para se aniquilar, mas como quem busca um sonho sem contrariedades e de que se possa à vontade fartar.
O drama de K. Maurício foi este – ter vivido tudo e nunca ter vivido; ter conhecido a vida através dos livros e não saber dar um passo na vida. Habituar-se a sonhar e ter medo de viver.


Raul Brandão, "A Morte do Palhaço"